Historial: Condenados ao sucesso

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@ "O Último Dia de Um Condenado", 1997 - foto de Valdemar Lopes



O Último Dia de Um Condenado

Em 1997 o nosso grupo resolveu tentar responder a um desafio: pegar num texto de importância histórica de Victor Hugo - «O Último Dia de um Condenado» e fazer com ele uma peça actual para Cabo Verde. Quando foi apresentada na cidade da Praia, um espectador escreveria, espantado: «Foi uma agradável surpresa descobrir que em Cabo Verde há quem faça teatro de tão boa qualidade».

Para quem vê o sol
“nascer aos quadradinhos”.
Texto inserido no programa da peça «O Último Dia de Um Condenado»


Esta é acima de tudo, uma peça sobre homens que, justa ou injustamente, se viram privados da sua liberdade. Resolvemos por isso, juntar um texto poético e de elevada carga dramática, escrito num contexto histórico passado, estóreas de presidiários actuais, feitas depois de uma investigação realizada na penitenciária de S. Vicente. São duas realidades concretas que se confrontam e se misturam, dois contextos diferentes cujos valores se confundem, duas culturas, duas línguas, um mesmo drama: o presídio, a condenação, a privação da liberdade.

Para criar uma maior dinâmica no espectáculo, e para tornar o próprio texto de Victor Hugo mais atractivo para o público cabo-verdiano, criaram-se dois mundos distintos: um do final do séc. XVIII, com personagens que falam um português de elevada carga dramática e poética (oriundo do texto de Victor Hugo), e onde se relatam os últimos pensamentos de um condenado à morte cuja sentença se irá executar no final (através dessa terrível máquina da morte que foi a guilhotina, e que estará presente na cenografia), e onde está bem patente o gênio da escrita de Victor Hugo; um outro, actual, dos anos 90, onde contracenam prisioneiros cabo-verdianos, com suas histórias do quotidiano (escritas a partir de uma série de entrevistas que foram feitas a vários prisioneiros e ex-prisioneiros de delito comum da Cadeia Civil de S. Vicente) e cujo texto é dito em crioulo. São estes dois mundos que se cruzam, se alternam e, numa das cenas, se relacionam. Com efeito, existe na obra original de Victor Hugo, um importante diálogo entre o condenado/protagonista e um preso de delito comum (da época); o que foi feito foi adaptar o texto do prisioneiro à actualidade cabo-verdiana e temos então um curioso diálogo entre um condenado do séc. XVIII e um outro de 1997, um falando em português, o outro respondendo-lhe em crioulo! As pequenas histórias (ou estóreas) do quotidiano actual de uma cadeia em Cabo Verde que se intercalam com a acção do protagonista são também uma oportunidade para fazer uma crítica, por vezes bastante dura, a certas realidades sociais. Os personagens-tipo são o reflexo disso mesmo. Com uma linguagem que, podendo chocar os mais sensíveis, não deixará de ser um espelho de uma realidade muito concreta: aquela que caracteriza o dia a dia de presidiários de delito comum. Temos assim neste espectáculo um Condenado dos finais do séc. XVIII que se cruza com um Homossexual, um Devoto, um Vitimado, um Revolucionário, um Degolador, um Mudo, um Delinquente, e uma Mulher que lhe entra num sonho vestida de enfermeira para lhe mostrar o quanto a vida é bela, o que acaba por funcionar como uma terrível armadilha pois é essa mesma vida que por lei dos Homens lhe vai ser retirada.

Um magnífico texto, como é o texto de Victor Hugo, não implica um bom espectáculo. Ajuda, mas não chega. Aliás, um magnífico texto, aumenta muito mais a responsabilidade de quem o coloca no palco. Nós só esperamos estar à altura do desafio, e poder dar a conhecer ao público cabo-verdiano um dos mais geniais escritores de todos os tempos. E dedicar este espectáculo a quem, hoje, justa ou injustamente, vê o sol “nascer aos quadradinhos”.

Abril 97 / João Branco
O Último Dia de Um Condenado

Ficha Técnica

Encenação
João Branco

Assitentes de Encenação
Elísio Leite e Silvoa Lima

Dramaturgia
João Branco

Dramaturgia das histórias cabo-verdianas
Colectiva

Cenografia
Paulo Miranda

Som / Iluminação
Paulo Miranda / Pedro Alcãntara e Cesar Fortes

Investigação na cadeia civil
João Crisóstomo

Actores
José Évora
Arlindo Rocha
Elisio Leite
Flávio Leite
Marlon Costa
Nelson Rocha
Nilton Sequeira
Roseno Rocha
Silvia Lima

Bailarino Convidado: Avelino Lopes


Apresentação

Dias 03, 04, 05, 06, 11 e 12 de Abril de 1997, na Alfândega Velha do Mindelo
Dia 08 de Agosto de 1997, no Centro Cultural do Mindelo
- Participação na inauguração oficial do Centro Cultural do Mindelo -
Dia 30 de Dezembro de 1997, na Cadeia da Ribeirinha

1 comentários:

Anónimo disse...

olá!

Sou um Ator brasileiro, e fiquei contente em saber da adaptação teatral do Grupo.

Pois, fiz a mesma em 2003, por se tratar de um tema "atual e instigante", além de Victor Hugo ser um mestre na literatura Universal.

Abraços!!

Edson Caeiro
S.Paulo - Brasil